terça-feira, 23 de junho de 2009

Gottfried Benn

NINGUÉM CHORE


Rosas, sabe Deus de onde tão belas,
em céus verdes a cidade
à tarde
no efémero dos anos !

Que saudades do tempo em que pra mim
um simples marco e trinta era vital,
sim, levado pela necessidade, eu contava os centavos,
tinha de ajustar-lhes os meus dias,
dias, que digo eu: semanas com pão e doce de ameixas
em potes de barro
trazidos da aldeia natal,
ainda iluminados da miséria caseira,
como tudo doía, como era belo e trémulo !

Pra quê o esplendor dos áugures europeus,
dos grandes nomes,
dos pour le mérite,
que olham para si e prosseguem criando,

ah, só o perecível é belo,
vendo pra trás a miséria,
bem como o zé-ninguém que não se reconhece,
soluça e anda aos carimbos do desemprego,

admirável este Hades
que toma o obscuro .
como os áugures -

ninguém chore,
ninguém diga: eu, tão só.


Gottfried Benn
50 poemas
versão de Vasco Graça Moura
Relógio d´Água
1998

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